Alberto Arcela

Publicitário e jornalista

Sociedade

O homem também chora


14/03/2023

(Foto: Reprodução)

A minha maior referência são os versos assinados por Zeca Baleiro, quando ele diz que anda tão à flor da pele que qualquer beijo de novela lhe faz chorar.

Hoje, eu me senti assim, quando li que mãe e filha foram encontradas mortas e abraçadas, sob os escombros de um soterramento no Rio.

E, mesmo não sendo uma cena de novela, ou talvez por isso mesmo, não resisti e chorei. Do mesmo modo que a imagem do pai segurando na mão da filha morta no terremoto da Turquia também me fez ir as lágrimas.

Não suficientes, com certeza, para uma comparação com esse amor sem tamanho que empresta sentido à vida em todos os momentos.

Sempre que penso nisso, me vem à mente o filme Sonhos, de Akira Kurosawa, que mergulha na cultura oriental e toda a sua sabedoria.

Nele, em um dos sonhos, o viajante se depara com o funeral de um homem velho que acontece com muita festa e alegria.

Intrigado, questiona o porque de se comemorar a morte, para descobrir o que para eles parece ser o óbvio. Triste mesmo é a partida prematura de crianças e jovens.

É o pedaço de si, cantado por Chico Buarque, a sua imagem e semelhança que se esvai. E no caso da menina soterrada, que se agarra a sua última esperança, o primeiro e definitivo amor.

E, no caso do pai, que se recusa a soltar a mão de quem tinha muitos planos e sonhos para o futuro, a perda de uma parte da vida.

De um modo geral, não deixa de ser uma ausência como acontece com o amor, só que com menos perdas e danos. Por isso, a gente também chora ao final de uma relação, porque não quer que a pessoa viva para mais ninguém.

Mas, é uma dor egoísta e menor, com corpo e sem alma, com partida e sem volta. E, o mais importante, sem a pureza da resposta das crianças de Gonzaguinha, o artista que descobriu que o homem também chora, como eu e você.


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